sábado, 4 de julho de 2009

Americana é acusada de matar amiga em jogo sexual



Dois nomes exercem um fascínio extraordinário sobre os italianos nos dias que correm. Um deles é o premiê Silvio Berlusconi, de 72 anos, um dos homens mais ricos da Itália. Desde que compareceu há algumas semanas sem cerimônia à festa de 18 anos de uma linda e até ali desconhecida ragazza napolitana, a quem deu um colar de diamante e ouro, a cara, faustosa e agitada vida amorosa de Berlusconi vem sendo freneticamente escrutinada pela mídia italiana e estrangeira. Depoimentos sobre as farras de Berlusconi vão se acumulando, e em meio às picantes revelações sua melhor frase é: “Nunca paguei por sexo”.
O segundo nome que captura a atenção apaixonada dos italianos é, curiosamente, uma jovem cuja idade, rosto e medidas se encaixariam à perfeição no padrão típico das mulheres que frequentam – por cachês de cerca de 2 mil euros, segundo inconfidências de algumas delas – as festas animadas do premiê. Amanda Knox, de 21 anos, “Rosto de Anjo” na definição ambígua dos jornalistas italianos, está no centro do julgamento do ano na Itália. Atlética, aluna dedicada e competente, filha de uma família de Seattle, Amanda é acusada de ter matado sua colega de quarto Meredith Kercher numa trama que mistura sexo anticonvencional, drogas e sangue em grandes quantidades. Amanda e seu ex-namorado Raffaele Sollecito estão presos sob a suspeita de ter matado Meredith, inglesa de Londres, depois de ela ter recusado participar de um jogo erótico. Outro envolvido, Rudy Hermann Guede, de 20 anos, natural da Costa do Marfim, já foi submetido a um julgamento sumário, dadas as evidências contra ele, e cumpre uma sentença de 30 anos na prisão.

O acaso reuniu Amanda e Meredith em Perúgia, uma cidade de paisagem deslumbrante na região da Umbria, no centro da Itália. Perúgia tem 160 mil habitantes, 40 mil deles estudantes de variadas partes do mundo que para ali acorrem em busca do reconhecido ensino de alta qualidade de suas faculdades. Foi o caso de Amanda e de Meredith. Perúgia, terra do aclamado chocolate Bacci (beijos, em português), impressiona pelo contraste embelezador entre a juventude permanente de seus estudantes e as linhas medievais de sua arquitetura.

Amanda e Meredith dividiam uma casa com mais duas alunas italianas. Estudar em Perúgia não é barato. O gasto médio de um estudante lá, tudo incluído, gira em torno de 1.000 euros por mês, ou cerca de R$ 3 mil. Tanto Amanda como Meredith, oriundas de famílias de classe média, trabalharam duro para poder financiar os estudos lá. Há relatos divergentes sobre como as duas se davam. O certo é que não eram, definitivamente, grandes amigas. Desembaraçada, exuberante, atraente, Amanda é o tipo de mulher que parece se encaixar melhor na companhia de homens que na de mulheres. Em seu diário, ela anotou que fizera sexo com sete homens desde que se instalara na Itália. Amanda se definira, no Facebook, como alguém com escassas “inibições sociais”.

Perúgia estava mais calma que o habitual no primeiro final de semana de novembro de 2007 graças ao feriado prolongado do Dia de Todos os Santos. As duas italianas que moravam com Amanda e Meredith tinham viajado. Estavam sozinhas na casa, descrita com graça e fluência por Amanda no Facebook como “bonita, bem no centro de Perúgia, a dois minutos da universidade. A casa tem uma cozinha, dois banheiros e quatro quartos, sem falar numa máquina de lavar e acesso à internet, sem falar na vista maravilhosa”.

Foi nessa casa que, na manhã de 2 de novembro de 2007, Meredith foi encontrada morta. Estava nua da cintura para baixo, a garganta cortada por uma faca, sob um cobertor ensanguentado. Um exame apontou, depois, que ela fizera sexo pouco antes de morrer. Também se descobriram evidências de que ela lutou pela vida. Policiais de Perúgia foram bater à porta da casa de Meredith depois que seu celular foi achado nas imediações. A porta de seu quarto estava trancada. Num primeiro momento, a polícia suspeitou que Meredith fora assaltada e morta por alguém que fugira pela janela do quarto, quebrada. Depois, foram se acumulando sinais de que se tratava de uma montagem. Segundo os peritos, Meredith agonizou por cerca de duas horas antes de morrer.

Na manhã seguinte à descoberta macabra, Amanda foi vista numa lavanderia com roupas e um par de sapatos para lavar. Estava acompanhada de um homem negro, que mais tarde se saberia ser Guede. Filho adotivo e problemático de um homem rico que o renegou depois de continuadas delinquências, notório viciado em drogas, testemunhas viram Guede lavar-se de sangue numa fonte em Perúgia horas antes de Meredith ter sido achada. Estava fora de si, segundo os depoimentos, e gritava: “Matei ela, matei ela”. O sangue nas roupas de Guede eram mesmo de Meredith. Ele nega tê-la matado, e afirma que o sexo foi consensual.

A versão de Guede, um “tremendo mentiroso” segundo seu pai adotivo, é que um homem irrompeu no quarto e atacou Meredith. “Você está ferrado, seu negro safado”, o assassino teria dito a ele. Guede afirma que ficou tão “assustado” que fugiu, uma história “altamente improvável”, segundo os investigadores. Guede foi capturado num trem a caminho da Alemanha em que viajava sem bilhete. Na noite em que Meredith foi encontrada morta, testemunhas afirmam ter visto Guede numa danceteria. Quando o DJ pediu um minuto de silêncio pela garota assassinada, ele continuou a dançar, segundo depoimentos.



Paulo Nogueira, de Perúgia(REVISTA EPOCA)

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