domingo, 30 de agosto de 2009

Irmãos sem direito a brincadeiras à luz do dia


Nasceram sem cor, numa família de pretos. Três irmãos que sobrevivem fugindo da luz, procurando alegria no escuro. O mais novo diz que é branco vira-lata. Os insultos do colégio viraram identidade. A mãe cochicha que são anjinhos. Eles têm raça sim. São filhos de mãe negra. O pai é moreno. Estiraram língua para as estatísticas e, por um defeito genético, nasceram albinos. Negros de pele branca. A chance dos três nascerem assim na mesma família era de uma em um milhão. Nasceram. Dos cinco irmãos, apenas a mais nova é filha de outro pai.

Essa é a história do contrário. Os dedos cruzados são sempre para chover. É o convite para o banho de mar na Praia Del Chifre, em Olinda. Rezam para espantar o domingo de sol. Só assim, com o céu pintado de preto, são crianças. Kauan, 5 anos, Ruth Caroline, 10, e Esthefany Caroline, 8, têm a liberdade controlada pelo fator do protetor solar. Não é só isso. São pobres e feridos. Não há dinheiro para parcelar a proteção. O PhotoDerm 100 é o maior sonho dos “galeguinhos” da V-9, favela de Olinda. Custa R$ 96 e só dura três semanas. O jeito é se esconder em casa mesmo. Televisão grudada no rosto. Vez por outra, Kauan, num estouro de criança, desafia o maior inimigo. Fecha os olhos e corre feito louco no meio da rua. Grita para o sol e escuta outro grito maior lá de dentro. É a mãe, Rosemere Fernandes de Andrade, 27, tentando evitar mais uma noite de ardor e ventilador ligado no máximo.

João Valadares
Do Jornal do Commercio

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