terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Cartório que recusou registro de Piedro já barrou 'Xismen' e 'Gesptsfl'

Oficial de cartório em Sorocaba mostra registro de nomes: "É preciso pensar no futuro da criança" (Foto: Jomar Bellini/G1)Sebastião diz que impasse com nomes acontece quase todo dia (Foto: Jomar Bellini/G1)







“Xismen” (em referência aos mutantes das histórias em quadrinhos X-Men), “Alucard” (Drácula, de trás pra frente) e o impronunciável “Gesptsfl”. Esses são apenas alguns dos nomes que já foram recusados em um cartório de Sorocaba (SP). Na semana passada, a notícia de que um pai foi impedido de registrar o filho com o nome que queria foi destaque no G1. O pai, Roberto Angelotti Junior, reclamou que teve que escolher Pietro, já que a oficial que o atendeu afirmou que o nome pretendido, Piedro, não existia e, por isso, não poderia ser utilizado.

Os casos citados no começo deste texto foram levados para análise de uma juíza, que concordou com a posição do cartório. Isto porque o parágrafo único do art. 55 da Lei de Registros Públicos prevê essa autonomia para os oficiais de cartório. O texto afirma que “não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores”. Se o responsável pela criança não concordar com a posição do oficial, o funcionário do cartório deve encaminhar o caso, via ofício, para um juiz.
“As pessoas chegam aqui e falam que podem colocar o nome que quiserem nos filhos, mas não é assim que funciona. Tem que pensar no futuro da criança, já que ela pode sofrer bullying ou outro tipo de constrangimento”, afirma o oficial responsável pelo Cartório de Registros do primeiro subdistrito de Sorocaba, Sebastião Santos da Silva.
Os pais nem sabiam o que significava isso [Gesptsfl]. Disseram que tinham inventado e achavam bonito. Nós não concordamos e mandamos para a juíza, que também não concordou"
Sebastião Santos da Silva,
responsável pelo Cartório de Registros de Sorocaba
De acordo com Silva, em outro episódio, um pai quis colocar na criança o sobrenome de “Corinthians”. O caso foi para análise da juíza, onde o responsável pelo bebê comparou o nome do time com o sobrenome “Santos”. A justificativa, entretanto, não foi aceita e o pai também foi impedido de ter o seu time registrado no sobrenome da criança.
O caso de Gesptsfl é um dos mais recentes. “Os pais nem sabiam o que significava isso. Disseram que tinham inventado e achavam bonito. Nós não concordamos e mandamos para a juíza, que também não concordou”, conta
Ele comenta que casos assim são normais comuns. “Isso acontece quase todo dia, mas na maioria das vezes os pais concordam com os oficiais e escolhem outros nomes para as crianças.”
"Piedro" pode
A confusão toda com o nome de Piedro só foi gerada porque o registro se deu no cartório dentro de um hospital da cidade. Segundo Silva, que é responsável pela unidade, o nome foi negado por se tratar de um erro ortográfico. “Pedro em italiano é Piedro. Mas em português, temos um erro de ortografia. É como se escrevessemos geladeira com ‘j’”, compara Silva.
O recém-nascido “Piedro” foi registrado como Pietro após a oficial sugerir a alteração no momento do registro. O pai contou ao G1 que aceitou a mudança, mas depois se arrependeu.
Pai foi impedido de registrar filho com o nome de Piedro (Foto: Arquivo pessoal / Roberto Junior)Pai foi impedido de registrar filho com o nome
de Piedro (Foto: Arquivo pessoal / Roberto Junior)








Segundo Silva, neste caso a criança poderia ter sido registrada como Piedro, desde que isto tivesse acontecido na sede do cartório, que fica no Centro da cidade. “A oficial conversou com o pai da criança e falou sobre a grafia correta. Como ele concordou e o caso não foi para análise da juíza, para mim este assunto já estava encerrado. Se ele nos procurasse aqui no cartório, faríamos uma observação na certidão de que o nome foi grafado conforme exigência do responsável, o que não pode ser feito no hospital.”
O oficial explica que a observação é um cuidado que a instituição tem para evitar que sejam alegados erros de digitação por parte do cartório. “Depois alguém pode dizer que o nome está errado e que o cartório errou na hora do registro”. Caso realmente exista um erro de digitação, basta o responsável pela certidão de nascimento procurar o cartório para providenciar a alteração.
Bom senso
Para o presidente da comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB, Eric Rodrigues Vieira, é preciso bom senso na hora de se registrar o nome de uma criança, já que a legislação sobre o assunto não especifica quais seriam os critérios que poderiam classificar como vexatórios os nomes escolhidos pelos pais. “Infelizmente não existe um manual para bom senso. De qualquer maneira, não é a opinião do oficial que deve prevalecer, mas sim a razoabilidade e bom senso.”
A orientação é que os pais recusem-se a efetuar o registro. “Caso os responsáveis insistam no nome, o oficial deve iniciar um processo administrativo de dúvida ao juiz corregedor. É esse juiz, com a participação do Ministério Público (defendendo o interesse do incapaz), que deverá sentenciar o ‘bom senso’ e definir se é possível ou não registrar o menor com o nome escolhido.”
Apesar disso, é importante frisar que o prazo previsto em lei para o registro das crianças é de 15 dias, que será ampliado em até três meses para os lugares distantes mais de 30 quilômetros da sede do cartório.
Ainda segundo Vieira, quando o nome escolhido causa constrangimento ou problemas na vida da pessoa, é possível alterá-lo por meio de ação judicial própria. “A lei fixa como prazo o primeiro ano depois de atingir a maioridade civil, aos 18 anos, para a pessoa requerer a alteração de seu prenome.”
Jomar BelliniDo G1 Sorocaba e Jundiaí

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